Ela se inspirou na carreira acadêmica para fundar startup de carne cultivada em laboratório

179

Cuidar de pacientes e trabalhar em consultórios era o futuro que Bibiana Matte esperava após entrar no curso de odontologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mas o envolvimento com a iniciação científica mudou completamente sua rota profissional e a lançou para empreender no setor de biotecnologia. Matte fundou a Ambi Real Food, startup que desenvolve carnes em laboratório.
Natural de Porto Alegre (RS), a empreendedora afirma que seu interesse por outras áreas científicas cresceu quando ela participou do Ciência sem Fronteiras. Encerrado em 2017, o então programa do governo federal incentivava a formação acadêmica no exterior. Foi estudando fora do país que Bibiana teve o primeiro contato com a metodologia que utilizaria nas suas empresas.
Thank you for watching
“Eu recebi uma bolsa para realizar pesquisas na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e foi lá que eu tive o primeiro contato com a ideia de cultivo de células, processo em que a gente isola as células nos laboratórios para estudá-las”, conta Matte a PEGN.
Com o término de seus estudos nos EUA, Bibiana voltou ao Brasil e finalizou sua graduação em odontologia, mas não seguiu na profissão. “Eu segui o caminho da pesquisa, então fui fazer doutorado na mesma universidade [UFRGS]. No doutorado, eu comecei a trabalhar em como reconstruir tecidos e órgãos no laboratório.”
Ela conta que naquela época já refletia sobre como transformar o que fazia dentro da universidade em aplicações para a sociedade. “Eu vi que tinha essa oportunidade de fazer testes de produtos e cosméticos, entre outros, utilizando essa tese de reconstrução [de tecidos]”.
Com esse conceito, em 2019, ela criou a Núcleo Vitro. “Na empresa fazemos testes de produtos [de empresas] em um modelo que nós desenvolvemos para reconstruir as principais camadas da pele” explica Matte. O método permite, por exemplo, testar os efeitos de cosméticos na pele.
Utilizando a reengenharia de tecidos, método aplicado na Vitro, e observando startups fora do país, Matte decidiu apostar em outro modelo de negócio. Em setembro passado, fundou a Ambi Real Food, com o propósito de ser a primeira startup a desenvolver tecnologia nacional para carne cultivada.O produto é diferente dos alimentos plant-based, que utilizam proteínas vegetais para imitar características da carne. “A carne cultivada é feita com a tecnologia de isolamento das células bovinas no laboratório. A partir disso nós utilizamos algumas metodologias para crescer essas células. Com essa tecnologia exclusiva de engenharia de tecidos, conseguimos fazer um produto que mantém sabor, textura e nutrientes, mas sem a necessidade de abater animais”, afirma Matte.
O pontapé inicial para a startup veio com um aporte inicial de R$ 200 mil da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do SUL (FAPERGS). Segundo Matte, a quantia foi utilizada para o desenvolvimento da tecnologia e a criação do primeiro protótipo de hambúrguer. Atualmente, a Ambi tem uma equipe de seis pessoas, além de contar com um time de conselheiros e mentores.
Segundo Matte, o objetivo da foodtech é fechar novas parcerias este ano com o objetivo de projetar sua planta industrial e lançar o produto no mercado.
Regulação
Para dar seus próximos passos, o produto ainda precisa da aprovação no Brasil. Até agora, apenas Cingapura regulamentou a comercialização desse tipo de carne. Ainda assim, já há empresas de olho nesse nicho por aqui. Em julho de 2021, a BRF anunciou uma parceria com a startup israelense Aleph Farms para produzir e comercializar esse tipo de produto até 2024.
“A gente já teve reuniões no Brasil entre Anvisa e Mapa [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento] para conversar e entender o que é esse produto, o que precisa ser considerado para ele ser seguro e ser lançado no mercado”, afirma Matte.
A empreendedora também afirma que fundações como a The Good Food Institute, que advoga sobre proteínas alternativas, estão próximas para acelerar essa nova realidade que pretende revolucionar o setor pecuário.