Guedes é denunciado por entidade de servidores à Comissão de Ética da Presidência

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O Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) denunciou o ministro Paulo Guedes (Economia) nesta quarta-feira (6) à Comissão de Ética da Presidência da República, após a revelação de que o titular da equipe econômica mantém recursos em um paraíso fiscal.

A entidade pede que seja instaurado processo para apuração de eventuais violações ao Código de Conduta da Alta Administração Pública, à Lei de Conflito de Interesses, à Lei de Improbidade Administrativa, e aos princípios da moralidade e da impessoalidade previstos na Constituição.

Para a Fonacate, há notório conflito de interesses de Guedes ao manter recursos em empresa no exterior enquanto está no cargo, pelo acesso a informações privilegiadas e pelos poderes de decisão, formulação e influência sobre políticas capazes de afetar investimentos financeiros.

“A regular abertura de offshores, por si só, não é ilegal, embora de moralidade questionável”, afirma a entidade na denúncia. “A questão é que, como Ministro da Economia, e, portanto, pessoa com acesso a informações privilegiadas e, mais grave, com poder decisório sobre políticas governamentais capazes de afetar investimentos financeiros, este ato, lícito aos cidadãos comuns em geral, configura flagrante conflito de interesses”, continua.

A Fonacate chama especial atenção para decisões do CMN (Conselho Monetário Nacional), órgão composto por Guedes e mais dois representantes –sendo um deles o presidente do Banco Central (que também teve recursos em paraísos fiscais).

Em 2020, o CMN afrouxou regras de declaração de ativos no exterior. Em 2021, facilitou a compra e venda de derivativos em outros países.

O artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal diz que configura conflito de interesses no exercício de cargo no Poder Executivo federal “praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público”.

O Código ainda determina que é “vedado o investimento em bens cujo valor ou cotação possa ser afetado por decisão ou política governamental a respeito da qual a autoridade pública tenha informações privilegiadas”.

A Fonacate diz ainda que o ministro tem sido protagonista nas discussões da reforma tributária, que passou justamente por discussão sobre taxação de paraísos fiscais. Em julho, Guedes defendeu retirar do projeto de lei do Imposto de Renda, apresentado originalmente por ele mesmo, a regra que tributaria recursos em paraísos fiscais. Para ele, a discussão complicaria o debate sobre o texto.

Para a entidade, o ministro também atentou contra os princípios da moralidade e da impessoalidade, previstos na Constituição, e cometeu ato de improbidade administrativa.

“Além de ilegal, é imoral e desonesto que o Ministro da Economia, o qual já acusou servidores públicos de serem “parasitas” do Estado, mantenha a gestão de ativos milionários em contas de paraísos fiscais no exterior e, ainda, que são valorizados de forma instantânea por variações cambiais diretamente influenciadas por suas decisões como agente público, permitindo-o, assim, lucrar milhões de reais sem qualquer esforço”, afirma a Fonacate.

A Fonacate diz que os fatos revelados agora são posteriores aos documentos analisados pela Comissão de Ética sobre o tema e, por isso, devem ser apurados.

A Comissão divulgou nota nesta semana afirmando que o caso de Guedes foi analisado em maio de 2019, mas ressaltou que o tema pode ser revisto diante de novos fatos ou de descumprimento de recomendações.

A existência dos investimentos de Guedes no exterior foi revelada no domingo (3) por veículos como a revista Piauí e o jornal El País, que participam do projeto do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, o ICIJ. Os documentos fazem parte da Pandora Papers, investigação sobre paraísos fiscais promovida pelo consórcio.

Segundo as reportagens, Guedes, sua esposa e sua filha são acionistas de uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, conhecido paraíso fiscal. Em 2015, ela tinha US$ 9,5 milhões (aproximadamente R$ 51 milhões, em valores atuais).

Guedes sofreu outros reveses após as revelações. O procurador-geral da República, Augusto Aras, determinou na segunda-feira (4) a instauração de uma apuração preliminar sobre as offshores ligadas a Guedes e ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Guedes também foi convocado por uma comissão da Câmara para explicar a conta no exterior.

Na terça-feira (5), a defesa de Guedes afirmou que irá protocolar de forma voluntária uma petição à PGR (Procuradoria-Geral da República) e ao STF (Supremo Tribunal Federal) “esclarecendo de forma definitiva que o ministro jamais atuou ou se posicionou de forma a colidir interesses públicos com privados”.

“Com relação à empresa Dreadnoughts, os documentos que serão protocolados deixam claro que o ministro desde dezembro de 2018 se afastou da sua gestão, não tendo qualquer participação ou interferência nas decisões de investimento da companhia”, afirma a defesa.

Os advogados de Guedes dizem ainda que documentos mostram não ter havido qualquer remessa ou retirada de valores para o exterior da companhia mencionada, desde quando Paulo Guedes assumiu o cargo de ministro da Economia e que ele “jamais se beneficiou no âmbito privado de qualquer política econômica brasileira”.